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Alessandro Atanes

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Descobri Navios Iluminados pela primeira vez em 2001 e não deixei de ler o livro até agora, tendo sido estudado na especialização (Uniban, 2001) e no mestrado em História Social (USP, 2008), com a dissertação História e Literatura no Porto de Santos: o romance de identidade portuária "Navios Iluminados".

 

Assim como a maior parte das pesquisas, a escolha do livro tem um pouco de acaso e muito de afeto.
 

O acaso vem da intenção ainda na especialização de usar a Literatura como fonte histórica. Em busca de livros sobre Santos, encontrei uma publicação do início dos anos 1980 da professora Wilma Therezinha com uma lista de obras de ficção e estudos sobre a cidade e lá estava o Navios Iluminados.

 

Como o livro havia sido reeditado em 1996 pela prefeitura de Santos, foi fácil encontrá-lo em sebos da cidade.

 

E nele encontrei em forma literária o universo do Macuco, o bairro portuário em que vivi dos 11 aos 22 anos, com as ruas que percorri de bicicleta e onde joguei bola. E nunca deixei de ler e reler a obra, me emocionando a cada vez como se fosse a primeira.

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Na dissertação, busquei enfocar a história da cidade e do porto de Santos (SP) por meio do uso da literatura como documento histórico, ressaltando o território do Macuco como um espaço de articulação entre o porto e a cidade; levantei as condições em que o romance foi escrito e contrastei a obra com outras ficções que têm o porto como tema.

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Baixe a dissertação no site da USP (http://teses.usp.br).   

O livro em minha vida
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Autor premiado pela Academia Brasileira de Letras, Ranulfo Prata (1896- 1942) tem como principal obra o romance Navios Iluminados, publicado em 1937 pela editora José Olympio. O livro tem como protagonista um migrante nordestino que busca ganhar a vida como estivador no porto de Santos. Ao lado de outros migrantes e imigrantes, José Severino de  Jesus tenta   sobreviver   no   bairro   portuário   do   Macuco,  ocupado   por trabalhadores   portuários  desde   a   virada   do   século   XIX   para o  XX, principalmente após a construção da sede da Companhia Docas de Santos na região em 1908.

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Ranulfo Prata é ele mesmo um migrante. Natural de Lagarto, no interior de Sergipe, inicia seus estudos de medicina em Salvador e conclui o curso no Rio de Janeiro no início da década de 20, tendo feito a residência médica no mesmo hospital em que Lima Barreto se recuperava de suas crises, ficando amigos. Nesse momento já havia lançado seu primeiro romance (O Triunfo, 1918). Nos anos seguintes, publica mais um romance (Dentro da Vida, 1922) e dois livros de relatos. Muda-se seguidamente entre o Rio de Janeiro, interior de São Paulo e interior de Minas Gerais, de acordo com o exercício da Medicina.

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Em 1927, conquista a vaga de radiologista da Santa Casa de Santos e muda-se com a família para a cidade, onde passa a trabalhar também na Sociedade Beneficência e no ambulatório da Companhia Docas, além de atender em seu consultório particular. É quando passa a travar contato com o universo dos trabalhadores do cais, matéria-prima de sua principal obra.

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Em meio à prática médica, fica sem publicar ficção até que o lançamento de Navios Iluminados. Nesse período, publica apenas uma obra, Lampião, de 1934, peça de não-ficção sobre o cangaço.

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De acordo com o historiador Luis Bueno, autor de O romance de 30, Navios Iluminados inaugura o que chamou de “romance da nova dúvida”, vertente literária dos anos finais da década de 30, quando a literatura proletária já havia perdido o horizonte revolucionário. O maior representante desse momento é Vidas Secas (1938), de Graciliano Ramos, também editado pela José Olympio, cujo estilo seco replica no campo narrativo a vida de seu protagonista, o retirante Fabiano, parente literário de José Severino. Em entrevista a revista Vamos Ler, em 1940, Prata falaria de como compôs as personagens de Navios Iluminados:

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Escrevo para satisfazer uma necessidade orgânica. Médico radiologista que não passo de mero fotógrafo de vísceras, escrevo porque não posso deixar de escrever. Há uma força incoercível dentro de mim, que me faz pensar, que me faz arquitetar enredos, que cria em meu cérebro uma porção de personagens, exigem vida própria e não me deixam sossegado enquanto não lhes dou liberdade, enquanto não apanho da pena para fixá-los no papel e aí encontrar suas aventuras.

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Silveira Bueno, na introdução à segunda edição do livro, traça uma relação entre os dois ofícios exercidos por Prata, o do médico e o do escritor: “A medicina disciplinara-lhe a fantasia pela observação cotidiana do ser humano, a obra mais real da Criação. O laboratório do médico educara os olhos do artista para tudo ver na medida exata da verdade, embora a fantasia do escritor atenuasse um pouco a crueldade dos episódios”.

As edições
Homenagem a Ranulfo Prata na Tarrafa Literária

Ranulfo Prata foi o nome escolhido para ser homenageado durante a 10ª edição da Tarrafa Literária. Durante o festival, realizado em setembro de 2018, trechos do Navios Iluminados foram apresentados antes de cada mesa em forma narrada, uma maneira de apresentar o romance ao público.

Confira:

Ouça trechos
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